Impressão 3D e Veiculação Localizada de Fármacos

A impressão tridimensional (3D) é considerada uma das tecnologias emergentes que estão a revolucionar a Indústria Farmacêutica e Biomédica. De uma forma simples, considera-se que a impressão 3D consiste na produção de um objeto sólido tridimensional, com qualquer forma, a partir de um modelo digital. A impressão 3D é alcançada através de um processo aditivo, no qual são depositadas camadas sucessivas de material com a forma pretendida. Exemplos de técnicas de impressão 3D que têm vindo a ser utilizadas na área biomédica são a fotopolimerização, a estereolitografia, o processamento de luz digital, o jato de tinta, a extrusão, a fusão da camada de pó, a sinterização com laser seletivo, entre outras.

Spritam® (levetiracetam), comprimido orodispersível indicado para o tratamento da epilepsia, foi o primeiro medicamento produzido por impressão 3D a ser comercializado após aprovação pela Food and Drug Administration em agosto de 2015, iniciando-se a Era “pharmacoprinting” na Indústria Farmacêutica. 

Neste contexto, uma das áreas onde a tecnologia de impressão 3D tem vindo a ser muito explorada por diversos grupos de investigação relaciona-se com os sistemas para veiculação localizada de fármacos. Estes sistemas centram-se no tratamento de patologias para as quais a administração oral ou sistémica enfrenta desafios, como a reduzida biodisponibilidade dos fármacos nos tecidos/órgãos alvo. A impressão 3D pretende obter estruturas diversas recorrendo a diferentes tipos de biomateriais (poliméricos, cerâmicos, metálicos ou compósitos) com uma arquitetura e dose do fármaco adaptado para veiculação localizada, permitindo a sua vetorização para um local específico (órgão, tecido), ou mesmo para compartimentos intracelulares.

Diversos exemplos vêm surgindo na literatura científica, designadamente o desenvolvimento de um patch impresso por extrusão contendo 5-fluorouracil para ser aplicado diretamente no pâncreas para suprimir o crescimento das células neoplásicas1. Outras aplicações referem-se à veiculação para o tecido ósseo através da produção de scaffolds, estruturas que mimetizam a matriz extracelular óssea e que podem ser combinadas com antibióticos, anti-inflamatórios ou antineoplásicos para o tratamento de patologia óssea2,3. Outro exemplo com enorme interesse refere-se à produção de microagulhas, um sistema de administração minimamente invasivo e praticamente indolor para o paciente, que pode facilitar a veiculação de fármacos em zonas de difícil acesso, como é o caso do ouvido interno4

Existem, ainda, muitos desafios no desenvolvimento destes produtos, nos biomateriais, nos processos e  em aspetos de regulação. No entanto, a tecnologia de impressão 3D aplicada a sistemas de veiculação localizada tem vindo gradualmente a despertar um interesse crescente e, a longo prazo, pretende-se que estes sistemas possam ser customizados a uma patologia, dose, local de ação e às especificidades de cada paciente.

Doutora Ana Francisca Bettencourt. 

Professora Auxiliar com Agregação em Tecnologia Farmacêutica, Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.