Nutrição e Saúde Intestinal
O intestino, órgão mais extenso do trato gastrointestinal, é colonizado por diversos microrganismos: fungos, vírus e centenas de espécies bacterianas. Juntos, caracterizam a microbiota intestinal, que varia consoante a idade, género, índice de massa corporal e nacionalidade do hospedeiro.
Estima-se que o número de microrganismos existentes no intestino seja 10 vezes superior ao número de células totais do corpo e o número de genes 100 vezes superior ao do genoma humano.
Os microrganismos que residem no cólon favorecem a saúde do hospedeiro através da biossíntese de vitaminas e aminoácidos essenciais, bem como ácidos gordos de cadeia curta (AGCC) – butirato, propionato e acetato – produzidos a partir da fermentação de nutrientes não digeríveis obtidos na dieta. Estes atuam como fonte de energia para as células do epitélio intestinal, fortalecendo a barreira intestinal, com ação anti-inflamatória.
A composição da microbiota é estabelecida durante o parto e também no decorrer da alimentação dos primeiros meses de vida. O término da fase de lactação induz alterações na microbiota devido à supressão de imunoglobulina A, tais como o aumento das bactérias Firmicutes e Bacteroidetes. O sistema imunitário desenvolve uma relação mutualista e de homeostase com os microrganismos colonizadores do intestino. Contudo, alterações na dieta, higiene, estilo de vida ou o consumo de antibióticos podem induzir variações na sua constituição. Se o equilíbrio for perturbado, ocorre disbiose e a relação hospedeiro-microbioma modifica, podendo desencadear inflamação crónica e patologia.
O consumo adequado de proteína, com uma ingestão de proteína vegetal relativamente superior à de origem animal (característica da dieta mediterrânica), correlaciona-se positivamente com a diversidade microbiana. Porém, quando a ingestão de proteína animal é predominante, pode verificar-se um decréscimo da produção de AGCC devido ao crescimento das bactérias anaeróbias. A elevada ingestão de proteína animal também está associada ao consumo de gordura saturada (característica da dieta ocidental, adicionalmente pobre em fibra), que coadjuvam a microflora anaeróbia com impacto na microbiota. O consumo preeminente de ácidos gordos mono e polinsaturados (presentes no salmão, cavala, sementes, óleos vegetais) aparenta não alterar a sua constituição, contudo, está associado a melhores outcomes metabólicos e indicadores cardiovasculares.
Os hidratos de carbono digeríveis (amido e açúcares simples: frutose, glucose, lactose) sofrem hidrólise sob ação enzimática no intestino delgado. A influência da lactose na saúde intestinal ainda é um tema controverso. Existem estudos que demonstram os seus benefícios, porém também é referida como um agente irritante gastrointestinal. As fibras e os amidos resistentes revelam benefícios pela estimulação do crescimento de microrganismos produtores de AGCC. Destaca-se que o consumo de fibra produz alterações positivas nos marcadores anti e pró-inflamatórios e na insulinorresistência.
No que se refere aos probióticos (bactérias vivas que integram alimentos como o leite fermentado, iogurtes) e polifenóis (presentes nos hortofrutícolas, chá, derivados do cacau, vinho), parece que o seu consumo produz melhorias no rácio de bactérias benéficas/patogénicas. Os probióticos apresentam ainda uma ação no alívio dos sintomas gastrointestinais, potenciam a resposta imunitária humoral e inibem a adesão de microrganismos patogénicos ao intestino.
Já certos aditivos alimentares encontrados em alimentos processados demonstram aumentar o stress oxidativo, com alteração da barreira epitelial e inflamação da mucosa em modelos animais. Porém, a composição da microbiota, função imunológica, nutrição e metabolismo diferem entre modelos animais e humanos, não sendo resultados extrapoláveis. Os adoçantes artificiais, como a sacarina e aspartame, parecem provocar disbiose e mediar um efeito indutor de intolerância à glucose.
Em âmbito de consulta, o nutricionista tem a responsabilidade de incentivar padrões alimentares equilibrados e hábitos promotores de saúde, desenvolvendo dietoterapias direcionadas ao alívio de sintomas provocados pela disbiose ou patologia intestinal diagnosticada. As recomendações e dietoterapias aplicadas têm em consideração as necessidades nutricionais, diagnóstico nutricional, hábitos e preferências alimentares do utente, de forma individualizada e fundamentada na evidência científica mais atual.
Dra. Natacha Nascimento